25.11.11

#gastronomia: a estrela michelin anunciada de ricado costa no yeatman

[Ricardo Costa, uma das novas estrelas Michelin 2012 anunciadas para Portugal, com a sua equipa na cozinha de The Yeatman (foto de divulgação)]


O guia "Michelin España & Portugal 2012: Hoteles & Restaurants" foi ontem lançado oficialmente (disponível online, aqui), em Barcelona.

[o restaurante enogastronómico de The Yeatman, agora premiado com uma estrela Michelin (foto de divulgação)]

A expectativa era grande. Entre as novidades anunciadas para Portugal, destacam-se a segunda estrela conseguida por Hans Neuner para o Ocean — que fica assim a par do Vila Joya, também no Algarve — e a primeira estrela conquistada pelo chef José Cordeiro para o Feitoria, em Lisboa, e pelo chef Ricardo Costa para The Yeatman, no Porto.

[Degustação no restaurante de The Yeatman (foto de divulgação)]

Escrevi em cima do acontecimento sobre o feito de Cordeiro  em lx@ddressbook (ler aqui), mas Ricardo Costa merece-me a mesma atenção. Estive em Agosto deste ano no Yeatman e não só fiquei rendido ao hotel, como, na altura, pressenti logo que a cozinha ali praticada pelo chef natural de Aveiro tinha potencial para conseguir uma estrela Michelin. Por isso mesmo, num especial sobre o melhor da gastronomia em Portugal encomendado pela revista Rotas & Destinos (publicado em Setembro de 2011), não hesitei em colocá-lo, a ele e ao restaurante, na categoria "debaixo d'olho".

[Uma das criações de Costa em The Yeatman: Lavagante com Iogurte de Ostras e Pó de Terrincho (foto de divulgação)] 

Não me enganei, mas o mérito não é meu. Não sendo crítico, não deixo de acompanhar o que se passa no mundo da alta gastronomia com crescente interesse. No caso concreto de Costa, este tinha a seu favor o facto de ter sido, em 2008, o mais jovem chefe de cozinha português a receber uma estrela Michelin — tão mais importante porque a conseguiu ao serviço do restaurante Largo do Paço (Casa da Calçada, Amarante), anteriormente distinguido quando o chef era o mesmo José Cordeiro que agora ganhou uma para o Feitoria.

[Um dos menus de degustação criados por Ricardo Costa (clicar na imagem para aumentar e ler)]

Se, em Amarante, Costa assumia a influência do que aprendera com a avó e os pais, ambos cozinheiros, em The Yeatman, com outros meios, tornou-se claro, para quem experimentou a sua cozinha, que a aposta era mesmo para a estrela — mesmo que não o confessassem de forma declarada.

[Ricardo em ação na cozinha de The Yeatman (foto de divulgação)]

Claro, não basta querer; fazer por isso, ajuda, mas também pode não ser suficiente — são muitos os chefs que tardam em ver o seu talento e esforço devidamente recompensados pelos críticos anónimos da Michelin. Felizmente, a coisa correu muito bem para Costa e para The Yeatman, não se confirmando os piores receios que apontavam o facto de estarem abertos há pouco tempo como um possível entrave à estrela.

Reproduzo abaixo o que escrevi sobre o chef e o restaurante no já mencionado especial da revista Rotas & Destinos (para ler o artigo na íntegra, clicar aqui): 

Mesmo os nascidos e criados no Porto mal conseguem esconder o assombro quando chegam ao terraço do hotel The Yeatman e dão de caras com aquele panorama para a cidade e para o rio. Ancorado numa encosta altaneira, sobranceira ao Douro, na margem de Vila Nova de Gaia, The Yeatman é mais do que apenas um hotel vínico, mas esse pormenor faz toda a diferença na sua proposta gastronómica. Para começar, o restaurante do hotel tem à sua frente o chef Ricardo Costa, que conseguiu uma estrela Michelin quando estava no Largo do Paço (Amarante),  e de quem se espera altos voos nesta sua nova morada. Depois, quer à la carte, quer através de menu de degustação, o  restaurante enogastronómico (preço médio: €50) pratica uma cozinha de raiz regional, mas com uma abordagem contemporânea e foco nos produtos frescos, que pode e deve ser harmonizada com os vinhos da excelente adega (são já 800 referências, com 25 mil garrafas, das quais 84% são rótulos nacionais). E como possui 70 parceiros vínicos, de todo o país, The Yeatman organiza, todas as quintas, um jantar enogastronómico dedicado a um deles.

Para terminar, a lista completa das estrelas Michelin 2012 em Portugal (um total de 12 restaurantes e 14 estrelas, mais duas do que em 2011):

2 estrelas: Vila Joya (Albufeira/Algarve) e Ocean (Porches/Algarve).
1 estrela: Feitoria e Tavares (ambos em Lisboa), The Yeatman (Porto), Willie’s (Quarteira/Algarve), São Gabriel e Henrique Leis (ambos em Almancil/Algarve), Il Gallo d’Oro (Funchal), Arcadas da Capela (Coimbra), Casa da Calçada (Amarante) e Fortaleza do Guincho (Cascais).

10.11.11

#livro: as dicas de heston blumenthal, o super chef britânico

[O mais recente livro de receitas de Heston Blumenthal, o chef britânico mais falado do momento (foto de divulgação)]
Não há duas, sem três.

Numa das minhas últimas incursões nocturnas pelas prateleiras virtuais da Amazon, acabei por sucumbir ao mais recente livro de receitas publicado pelo super chef britânico Heston Blumenthal ("Heston Blumenthal at Home", Bloomsbury Publishing, 408 págs.), arrematado a metade do preço inicial (paguei cerca de €18, com portes de envio grátis) apesar de só ter sido lançado em Outubro.

De tentações (e boas pechinchas) está a Net cheia, eu sei. Mas, se tinha algumas reservas iniciais sobre o lado prático do livro, estas foram rapidamente esquecidas mal o tive nas minhas mãos e comecei a explorar os vários capítulos.

[Qual estrela Pop, Heston posa regularmente para a GQ britânica, e não só (foto com direitos reservados)]

Heston, tal como certas modelos, já ascendeu à categoria estratosférica de chefs que ganharam o direito a prefixos como super ou über para os distinguir dos demais. O seu restaurante, Fat Duck, ostenta três estrelas Michelin e está há anos de pedra e cal no top 10 da lista dos 50 melhores restaurantes do mundo. Este ano ainda, lançou o Dinner by Heston Blumenthal, no Mandarin Oriental de Londres, que se propõe a revisitar de forma contemporânea o receituário da época Tudor.

["Meat Fruit", uma das receitas históricas britânicas que Heston recuperou para o seu Dinner e que, qual trompe-l'oeil, possui recheio de foie gras e fígado de galinha (foto de divulgação)]

Mas, o facto de estar debaixo dos holofotes, ou talvez por isso mesmo, não quer dizer que seja consensual. Bem pelo contrário. Há críticos que não suportam o tipo de experimentalismo praticado no Fat Duck e outros tantos que não se deixaram convencer totalmente pelo conceito (supostamente uma brasserie fina) do novo Dinner (vídeo abaixo).


Polémicas e divórcio à parte — o fait divers fez as delícias da imprensa rosa, que não se coibiu de comentar a troca da mulher legítima por uma vistosa autora norte-americana —, Heston soma e segue. Eleito chef do ano pela revista GQ britânica, ele repaginou o visual, volta e meia está na TV ou nas revistas e tem sempre um livro ou outro projecto engatilhado. 

Em suma, ele não pára, mas também trabalha para isso. Não há milagres.

[No livro, uma salada apresentada como um "jardim" (foto de divulgação)]

Voltando ao livro, o meu medo era que fosse muito "técnico" e que tivesse o foco apontado para receitas muito trabalhosas que, na boa, são impraticáveis para o comum dos mortais, sem tempo, nem meios ou conhecimentos, para as colocar em  prática.

[Mais do que uma simples tosta de queijo, como demonstra no livro (foto de divulgação)]

Mas Heston faz jus ao título do livro e presta, efectivamente, um bom serviço a quem gosta de cozinhar em casa. Além de dicas bastante úteis de base, que só acrescentam mesmo que não as queiramos aplicar, ele reuniu em várias secções (como caldos, sopas, entradas, saladas e por ai vai) receitas que dão a volta a clássicos estafados como o cocktail de camarão, a carbonara ou até mesmo uma simples tosta de queijo ou um gin tónico, por um lado, não se esquivando, por outro, em partilhar, passo a passo, os truques para fazer um bom assado, defumar salmão ou não ficar intimidado com a conservação em vácuo.

[Outra receita partilhada no livro, a de chocolate quente (foto de divulgação)]

Faz boa vista em qualquer salão, mas "Heston Blumenthal at Home" é daqueles para ter na cozinha, sempre à mão de semear.

9.11.11

#livro: a memorabilia de nova iorque

["Fulton Street Dock, Manhattan Skyline (1935)," por Berenice Abbott]

Nova Iorque, a cidade de todos os epítetos, é um tema inesgotável. A prova disso é que já perdi a conta a todos os livros que foram publicados, só nos últimos tempos, sobre ela.

Como não sou indiferente nem à cidade nem a muitas das coisas que lhe dizem, directa ou indirectamente, respeito, tenho já um punhado deles, mas não resisti a juntar mais um à (ainda assim) modesta colecção.

"New York - The Story of a Great City" (Andre Deutsch Book, 130 págs.), publicado em parceria com o Museum of the City of New York (aliás, a edição é da sua directora, Sarah M. Henry), está disponível em Portugal (encontrei-o, por exemplo, na loja online da livraria Bertrand por cerca de €33), mas foi através da Amazon (UK) que consegui um melhor negócio: versão capa dura por cerca de €26 (com portes de envio grátis).

E o que tem ele de especial? São 400 anos de história (e de estórias) revisitados através dos arquivos do museu da cidade, que disponibilizou ilustrações, gravuras e fotografias. Mas, convenhamos, se fosse só isso, nada de verdadeiramente novo teria sido acrescentado.

[Reprodução de um postal de 1914 da Brooklyn Academy of Music]

O que o distingue dos demais é o facto de trazer encartado, com recurso a um design bem esgalhado, vários facsimiles removíveis e reproduções de documentos, mapas e artefactos antigos que estavam esquecidos. A memorabilia inclui, entre outras preciosidades, o primeiro bilhete de metro vendido, a primeira página do jornal que noticiou o funeral de Abraham Lincoln ou a autorização dada a um negro forro para circular livremente.

É um livro para ser visto — e por isso pertence assumidamente à categoria dos coffee-table —, mas também apreciado. Numa cidade que se reinventa diariamente (cliché oblige), não deixa de ser interessante percorrer os seus 400 anos por caminhos menos óbvios.

8.11.11

#livro: portugal de lés a lés com o chef ljubomir stanisic


1 livro
10 capítulos
61 horas em viagem
23 dias fora de casa
5 hotéis
5 casas e quintas de turismo rural
754 e-mails trocados
498 telefonemas
232 sms
55 ilustrações
1347 fotografias
120 amigos à mesa
6 mercados
3 hortas biológicas
3 talhos
4 chefes de cozinha convidados
Mais de 3000 ingredientes utilizados…

Para o seu segundo livro, à venda desde ontem (dia 7), o chef jugoslavo Ljubomir Stanisic fez contas a muito mais coisas do que apenas aos quilómetros — e foram 5764, já agora — palmilhados em Portugal continental.

"Papa Quilómetros — Uma Caminhada pela Gastronomia Portuguesa" (Casa das Letras, 320 págs., €25), lançado a tempo do Natal, não é só mais um livro de receitas ou de cozinha. É um tratado de amor (mais um) entre um homem e um país que se adoptaram mutuamente.

A história e o percurso de Ljubo (como, entretanto, passou a ser conhecido) são sobejamente conhecidos. Aliás, apetece mesmo perguntar se ainda há alguém que não tenha dado por ele em Portugal e arredores?

À frente do restaurante 100 Maneiras, do Bistro 100 Maneiras (ler aqui) e agora também d'O Nacional 100 Maneiras (que funciona no clube de natação lisboeta Nacional, à rua de São Bento, nº209), Ljubo está em todas. Desdobra-se em entrevistas na rádio, é convidado para vários eventos e presença assídua nas revistas, mas foi a televisão, e a sua passagem recente como jurado do programa "MasterChef", que fez com que muita gente de fora das lides gastronómicas passasse a associar o nome (e a cara) à pessoa e à obra.

[Ljubo é conhecido por cozinhar nos lugares mais improváveis, a céu aberto (©constantino leite, todos os direitos reservados)]

Ljubo não inventou a pólvora. Nunca como agora os chefs estiveram tão em foco e, um pouco por toda a parte, os que têm mediatismo e carisma aproveitam, e muito bem, o "momento" para lançar livros e investir no marketing pessoal.

Nada de errado nisso; sobretudo quando, como é o caso, há talento, criatividade e trabalho de sobra. Lujbo ganhou um lugar de destaque na cena gastronómica de Portugal não só porque sabe usar muito bem — e a seu favor — as novas plataformas, mas porque é, de facto, bom e não faz mais do mesmo. Ele (re)pensa a cozinha.

O novo livro é disso prova. Ljubo reuniu amigos e colaboradores habituais — como a jornalista Mónica Franco, sua mulher, que não se limita a assinar o texto e teve um papel essencial na produção do projecto; o fotógrafo Constantino Leite ou o ilustrador Hugo "Makarov" Martins —, escolheu a dedo os hotéis — do Aquapura Douro Valley ou Vidago Palace à Casa das Penhas Douradas —, os lugares e os restaurantes — como o Eira do Mel, em Vila do Bispo, ou o São Rosas, em Estremoz.

[A serra da Estrela, e a carqueja, foi um dos lugares por onde passou e que registou no livro (foto com direitos reservados)]

Receitas são 80, explicadas tintim por tintim e profusamente ilustradas. Mas, como escrevi no início, este não é só um livro de receitas — ele sugere roteiros, aponta locais e partilha até músicas. O que salta à vista, ao folhearmos o livro, é um levantamento que fica para a posteridade de todas as coisas boas que Portugal tem para oferecer, por vezes nos lugares mais inesperados ou recônditos, não só a nível de produtos, mas também na forma de estar.

E é, atrevo-me a acrescentar, um trabalho só possível para alguém que, nos últimos anos, tem desenvolvido um notável esforço de aproximação aos pequenos produtores portugueses e que, estando dentro, não deixou de nos olhar de fora.
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